A forma como a discussão « ABORTO » foi/é abordada é o problema real...
Senti a derrota da discussão sobre o « aborto legal » na Argentina como se fosse minha também (e estou a km’s de distância de tal discussão). A forma como os direitos humanos se movem a diferentes velocidades no mundo preocupa-me muito.
Estive a reflectir um pouco e creio que a forma como a discussão é apresentada à sociedade é o GRANDE problema.
Falamos de sociedades com graus de literacia pequenos (a educação infelizmente não chega a todos e a que chega é muitas vezes de qualidade duvidosa, vejamos o caso da deputada que defendeu o seu voto contra a lei porque não leu um diploma que tem meses de discussão !?). Sabendo desta falência social é preocupante lançar uma discussão à sociedade onde o assunto é escolher entre estar do lado da « vida » ou da « morte », quando o problema REAL não é esse.
Falarei do caso argentino, que é o que tem prendido mais a minha atenção ultimamente, mas a minha reflexão pode-se aplicar às diferentes nações cujas sociedades buscam corrigir erros dos direitos humanos que têm sido abordados de forma errada durante séculos/milénios.
Não me focarei na qualidade duvidosa dos argumentos apresentados durante a discussão parlamentar que levou ao adiamento da decisão que vai ter de ser revista e afrontada num futuro, porque um Governo não pode colaborar com a clandestinadade de forma tão irresponsàvel.
A discussão tem sido apresentada e discutida em termos dos que estão a favor ou contra o aborto. ERRO.
Ninguém està a favor do ABORTO, essa é a realidade. Todos gostariamos que essa realidade não existisse, assim como gostariamos que o cancro fosse uma anedota de ficção cientifica, ou que as guerras comerciais no oriente não matassem com bombas as populações indefesas, etc... Negar a existência de um problema é uma fantàstica arma do cérebro humano para tornar a realidade um pouco mais suportàvel, mas que infelizmente não a apaga, não a anula, não a faz desaparecer !
O ABORTO EXISTE. Ponto. E a discussão deveria ser, como é que a sociedade se deve comportar e organizar perante esta realidade.
Os que não estão a favor da lei, estão em negação, porque acreditam que não existindo leis que regulem este assunto, ele vai deixar de existir. ERRO.
Os que estão a favor da lei, entendem que se trata de uma realidade e estejam a favor ou não das mulheres que por alguma razão se vêem empurradas para esse pesadelo (não é nenhum sonho abortar, por isso pensar nisso como acto contraceptivo é no minimo muita falta de informação que tem de ser colmatada com mais campanhas de educação sexual), sabem que é preciso organizar e controlar o assunto para que não morra nem a mãe, nem o feto.
Sim, senhores pro-vida, quando a mãe morre ou não està bem, o feto é inevitavelmente afectado. È como querer manter um coração a bater sem o resto do corpo.
Em pleno séc. XXI, a discussão deveria ser como é que afrontamos o problema e não continuar a negà-lo e dessa forma alimentar a clandestinidade e a sua economia paralela que tanto dinheiro rouba aos cofres pùblicos e que depois não podem ser aplicados em melhores hospitais, melhores escolas, melhores ruas, melhores jardins, melhores serviços pùblicos, etc... Tudo se interliga, por mais que o ignoremos.
Tenho a sorte de nunca me ter visto de frente a uma situação de aborto e tenho a sorte de que se algum dia me vir nessa situação, vivo numa zona do planeta onde poderei contar com condições sanitàrias para o fazer, contarei com apoio médico para que o impacto seja minimo, contarei com apoio psicològico para que o impacto emocional seja mais suportàvel. E AMARIA que todas as mulheres do mundo contassem no mìnimo com isso também.
Todas as nações que decidiram deixar de negar a existência dessa realidade, viram as mortes maternas diminuir, o nùmero de casos de abortos descer e a qualidade de vida das suas crianças aumentar. Porquê continuar a negar isso às vossas sociedades, senhores governantes de nações onde a discussão ainda està em nìveis pré-històricos ? Se não tivessem com que comparar, poderiamos tentar compreender, mas não é o caso.
Fico a torcer para que as sociedades repensem os termos da discussão e entendam que não é uma questão de matar ou viver, é muito mais complexo e é preciso pelo menos perder um pouco de tempo a ler os diplomas antes de uma votação tão importante.
O ABORTO, envolve muitas realidades (pobreza, educação deficitària, drogas, alcoolismo, depressões, etc...) e todas têm de ser reguladas para que realmente se comessem a SALVAR vidas e negar a existência dessas duras realidades não é solução, apenas disfarça a tua consciência.
Nas nações onde a situação foi levada a lei, começou-se por afrontar a qualidade da assistência médica, mas podem começar por outras realidades como a implementação da educação sexual (apesar de que esse ponto demora muito mais tempo a dar soluções).
De todas as formas #seraley.
A realidade sempre se impõe !