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Aerdna no Mundo?

A definição da palavra "mundo", não é restrita. A minha preferida, engloba os vàrios conjuntos de realidades concretas e imaginadas. Aqui veremos o mundo pela escrita de Aerdna.

Aerdna no Mundo?

A definição da palavra "mundo", não é restrita. A minha preferida, engloba os vàrios conjuntos de realidades concretas e imaginadas. Aqui veremos o mundo pela escrita de Aerdna.

As nossas diferenças e as etiquetas “...ismo”

Eu tenho um problema com estas palavras, pela forma como elas nos são apresentadas. Nós somos uma coisa, porque não somos a outra, é quase sempre a premissa. Isso incomoda-me, porque parece obrigar-me a encaixar em algo que não me define completamente.

Eu sou portuguesa e isso é apenas uma parte da imensidade de coisas que me definem. Sendo portuguesa, eu não me posso identificar com a cultura cigana em algum aspecto? Ou com a cultura africana em outro? Eu cresci católica e acredito-me ateia, por isso não posso identificar-me com algumas regras budistas, ou até muçulmanas? Ser portuguesa ateia, talvez sejam as minhas características mais evidentes para os outros, mas não são a minha definição completa. Até porque essa definição é um processo ainda em construção. Estar vivo é um enorme processo em evolução, não é um processo estático.

No meu trabalho actual, convivem diversos credos e eu gosto disso, porque me prova que o diferente convive sem problemas, apesar de tudo o que se grita por aí. Pode-se melhorar? Muito. Contudo, a convivência pacífica permite o espaço para que essas melhorias ocorram.

Perto das festas de final do ano passado, estávamos todos juntos a comer no refeitório e surgiu uma discussão à volta da figura do Pai Natal.

Dois dos nossos colegas são judeus. Ela é mais radical, com dificuldades para discutir ideias diferentes das suas, porém como não recebe muito mais que longos silêncios de apoio, acaba por moderar-se. Ele é mais diplomata e aberto a discussão. Temos uma etiqueta comum, a de «judeu», porém valores e comportamentos diferentes. Nesse almoço, ele comentou o difícil que era fugir ao apelo do Pai Natal depois que a filha entrou para a escola, apesar de que a sua religião não se identifica com essa figura.

Alguns explicaram que na realidade a figura do Pai Natal, tal como a conhecemos agora, é uma figura comercial e não religiosa e por isso acaba por ser transversal a muitos cultos. Outros agregaram que antigamente a imagem do Pai Natal estava associado ao bom comportamento, visto que ele só dava prendas aos meninos bem comportados, mas actualmente a figura é um sinal de status. Os pais competem para serem os melhores Pais Natais, dando aos filhos as prendas que mais impacto venham a causar socialmente. Dessa forma pretendem ganhar a competição de melhores pais do mundo, segundo o preço que pagaram pelo presente. O problema é que isso nem sempre vem associado à passagem de bons valores. Ainda houve quem defendesse que os verdadeiros valores que o Natal celebra já não são conhecidos pelas novas gerações.

Porém o interessante da discussão para mim, surgiu quando eles começaram a descrever as tradições da festa tradicional de fim de ano na sua religião, o Hanukkah. Essa celebração judia de dedicação e luzes não é uma versão do Natal católico, mas quando os ouvimos falar dessa festa de oito dias, percebemos que há semelhanças gritantes: famílias juntas, velas que celebram milagres, comidas tradicionais, presentes para as crianças em algumas comunidades... No fundo, a forma é diferente mas o fio condutor é o mesmo. Tanto católicos como judeus usam as festividades para estarem mais próximos dos seus e dedicarem-se um pouco ao seu ser espiritual. Pode-se discutir que essas festas estão cada vez mais comerciais, mas a essência está aí presente nos rituais que ainda se conseguem manter, apesar do Pai Natal e dos «...ismos», como consumismo e capitalismo, que atingem a todos independentemente da religião, da cor, dos gostos, das ideologias...

Nessa pequena discussão de almoço, eu descobri as semelhanças quando as diferenças foram expostas. Isso faz-me pensar que estamos todos muito desatentos e surdos.

Queremos liberdade para sermos quem somos mas, isso só se conquista com respeito. A partir do momento que eu desrespeito o outro, eu abri a possibilidade de que ele me desrespeite para se defender e condenei a minha liberdade.

O racismo voltou à discussão por causa de uns monstros que por acaso eram brancos e que sem nenhum respeito pela vida humana mataram um homem de forma cruel, numa nação que conta com as ferramentas democráticas necessárias para que os crimes sejam julgados com civilidade.

O que é que está a falhar à nossa atenção? Como identificar estes monstros? Talvez não os possamos identificar, porque a o contrário da crença de alguns, a maldade não se vê na embalagem, ela não tem cor de pele nem características físicas específicas.

As sociedades deviam combater a verdadeira maldade escondida em discursos de ódio, que alimentam e dão coragem às almas mais enegrecidas, tirando-lhes as correias da moderação, que as impediam de agir segundo os seus maus instintos. Não é com violência que se combate a violência, assim como não se apagam chamas atirando gasolina. Não é com insultos baratos nas redes sociais que se conquista respeito e credibilidade. Não é com palavras caras, que a maioria não entende, que se passa a mensagem. Há que adaptar-se a todas as realidades, se queremos coexistir em paz. Repensar o que foi feito e fazer melhor.

Precisamos de líderes com bom senso urgentemente, que possam promover uma discussão moderada e humanamente justa. A história da humanidade conta-nos que os feitos conquistados com diplomacia são melhores e mais duradouros. A violência só pode impor durante um tempo, até que a revolta se dê no outro lado da discussão. A diplomacia explica a necessidade da medida e o outro aceita porque compreende. A violência impõe e o outro submete-se sem entender, até que tem oportunidade de rebater.

Isso também se aplica na educação das nossas crianças. Se os ensinamos com diplomacia, eles seguirão as regras conscientes. Se as impomos com violência eles só as seguirão até que as condições mudem e se possam libertar. Aqueles que só conhecem a violência como método de libertação, só a ele podem recorrer. É preciso mudar isso. Podemos e devemos mudar isso.

A experiência de Milgram, mostrou-nos a relação da obediência com a autoridade. Isso, porque se a autoridade mandou, eu não me sinto responsável. Esse desprendimento da responsabilidade é o verdadeiro perigo.

Se queremos menos violência temos de responsabilizar. Só vamos consegui-lo, se ensinarmos a questionar o porquê de uma ordem. Isso fará com que as autoridades se preparem melhor e os executantes não respondam sem consciência dos seus actos. Se houver consciência do outro e do dano causado, teremos menos gente disposta a responder a ordens sem sentido: como por exemplo, mata porque a pele é diferente. A pele é diferente, mas não há gente perigosa de pele igual à nossa? Há e os vídeos da morte de George Floyd provam-no.

Desde os nossos lugares de simples cidadãos, podemos promover mudanças. Serão mais lentas, mas têm de ser feitas. Mesmo com a sorte de conseguirmos lideranças capazes, nada mudará se não agirmos desde os nossos humildes lugares.

Acabemos com essas etiquetas, que servem como recurso para facilitar as divisões entre as pessoas e, permitem o domínio por parte de gente incapaz. Um a um, podemos fazer a diferença: educando para o respeito igual das diferenças. Responsabilizando, dando a conhecer as consequências para que todos sejam conscientes dos seus actos e não se desprendam deles com a desculpa de que a autoridade é que manda. Exigindo autoridades capazes e com provas dadas e deixando de dar oportunidades a pessoas com discursos que nunca saem das teorias. Mais do que um líder que combate «inimigos» o tempo todo, queremos líderes que se ocupem das nossas necessidades colectivas, porque populações com educação, saúde e justiça, enfrentam qualquer coisa. Sociedades saudáveis não precisam de inimigos constantes e aprendem a respeitar o outro apesar das formas diferentes de fazerem as mesmas coisas, ou das características naturais.

Não esquecer que cor de pele é uma característica dada pelas leis naturais, mas os valores que seguimos na vida são escolhas individuais.

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