Aumento de PREÇOS e os seus efeitos macabros
Na imprensa francesa foi contada a experiência do jovem padeiro Julien Bernard-Regnard com o aumento generalizado dos preços, e em particular com o aumento da factura de electricidade. A história deste empreendedor, dono de uma padaria na vila de Bourgaltroff (Moselle), é um retrato muito interessante e atual. Deixa-nos a pensar!
Com o aumento do preço das matérias-primas, Julien teve de ajustar o preço de venda dos seus produtos. Contudo esse ajuste tem um limite, para não perder clientes e o seu negócio deixar de fazer sentido. Tudo estava controlado até setembro passado, quando a sua factura de electricidade passou de 450€/mês a 1300€.
Abismado, recusou-se a fechar a porta e colocou todos os seus esforços para diminuir essa factura. Assim que passou a começar os trabalhos às 2h da madrugada, em vez das habituais 4h, para poder aproveitar ao máximo os preços mais baratos da electricidade no horário vazio. Desligou tudo o que não era imperativo para o funcionamento da loja e acabou com a produção depois do meio-dia. O consumo baixou um pouco, mas os preços voltaram a mudar e a sua factura aumentou para 1400€/mês.
Era preciso diminuir os gastos. Ele não tinha como prescindir da electricidade: forno, câmara fria, vitrines refrigeradas... Se não podia baixar a factura da electricidade, tinha de recorrer ao que todas as empresas do mundo recorrem quando precisam diminuir gastos rapidamente: despedir. Assim que a sua vendedora foi dispensada e ele assumiu todo o trabalho sozinho: da produção à venda. O seu horário rondava as 100h/semanais.
Porém, apesar de todos os seus esforços, viu o fundo ao poço. Recusou-se a percorrer o mesmo caminho que outros do sector, que não viram mais saída que piratear o contador, e declarar FALÊNCIA foi o único que lhe restou. De setembro a janeiro, um negócio que funcionava, e dava emprego, faliu.
Podia-se ter evitado?
Tendo em consideração os lucros de alguns sectores que têm vindo a ser publicados, eu acredito que sim. Bastava que houvesse políticas para controlar o preço do lucro.
Olhando para o panorama geral, o que realmente ficou mais caro foi a margem de lucro, não as matérias. Um pequeno grupo de gente "privilegiada" está a tirar partido do azar do povo ucraniano, e por consequência de nós. Hoje, enquanto accionistas de empresas de energia, do sector bancário, do sector imobiliário lucram como já não faziam há décadas, pequenos negócios estão condenados a desaparecer, e com eles os empregos que sustentavam muitas famílias.
Ouvimos discursos constantes de que temos de poupar e poupar. Insistem que a solução está dentro de nós e outras manipulações retóricas. Só que enquanto nós passamos frio para não ligar o aquecedor, eles poupam nos gastos de produção com a electricidade que deixamos de consumir e aumentam os preços para não perder o rendimento líquido das facturas que pagamos. Negócio redondinho!
Se pensarmos que os nossos impostos pagam uma máquina chamada Estado para que esta se ocupe de não deixar a balança de interesses se desequilibrar, creio estar na hora de perguntar o que é que vai ser feito efectivamente para que a história de Julien não se multiplique em terras lusas. Já chega de nos entreterem com a novela das contratações, onde nunca ninguém sabe, num tempo em que se sabe de tudo e de todos.
Podíamos começar por aumentar o preço do trabalho de acordo à inflação, usando o mesmo argumento que eles usam para nós pagarmos mais pelos serviços. Se os preços aumentam por causa do suposto aumento das matérias-primas, nós também o precisamos reflectir no preço do nosso trabalho, afinal comemos mais caro, deslocamo-nos mais caro, pagamos mais para aprender e curar. Um corpo humano gasta muito para estar apto para o trabalho, também temos direito à nossa justa margem de lucro, seguindo o raciocínio capitalista.
A única forma de abrandar esta "crise" é que os políticos cumpram a sua função: impedindo que alguns ganhem mais do que precisam e evitando que outros não ganhem o suficiente. Infelizmente, eles recebem mais pressão da parte dos capitalistas que estão sempre a soprar-lhes no ouvido. Para equilibrar isso, é preciso que o povo também faça a sua voz retumbar.